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Vice-presidente da Cummins, Cristina Burrola, crê que ano será desafiador e acredita no potencial da operação nacional

Entrevistou a executiva, que falou sobre os próximos passos da companhia e também discorreu sobre sua carreira e sua vida pessoal.


Marcus Celestino

O pai de Cristina Burrola a deixou quando ela tinha nove anos de idade. A abandonou e também abdicou de seus outros cinco irmãos. Todos foram criados pela mãe, que, solteira, teve de encarar a virilidade agressiva da sociedade mexicana a fim de levar o sexteto a uma posição de sucesso no futuro.

E a matriarca, ao menos com Cristina, logrou êxito. A filha rompeu as barreiras do machismo estrutural latino-americano, graduou-se em Engenharia Elétrica e Industrial pelo Instituto Tecnologico de Chihuahua, fez um mestrado na mesma seara pelo Tecnologico de Monterrey e ainda obteve um MBA da prestigiosa Northwestern University. Desde abril de 2022, além de mãe de cinco filhos, é vice-presidente e líder para a América Latina da Cummins.

Na companhia, dona de uma receita de US$ 2,4 bilhões, Cristina Burrola é responsável por comandar mais de 11 mil colaboradores em 16 países da região. Ademais, desenvolve e implementa estratégias para o crescimento dos negócios nos mercados de distintas características, cria soluções para fidelizar os clientes e garantir um ambiente que permita aos funcionários atingir todo o seu potencial.

Automotive Business entrevistou a executiva, que falou sobre os próximos passos da companhia e também discorreu sobre sua carreira e sua vida pessoal. Confira abaixo, na íntegra, a conversa.

Como você equilibra as responsabilidades de liderar a Cummins na América Latina com seu papel de mãe de cinco filhos?

Claro que, liderar a Cummins é algo de imensa responsabilidade. Tenho de olhar para todas as nossas operações, mas também para o nosso pessoal, que, de fato, é nosso ativo mais importante.

No caso, todos os meus filhos já estão trabalhando. São mais velhos. Meu marido tem três filhos, de seu primeiro casamento, e eu tenho dois. Todos com idadades entre 26 e 34 anos. Ou seja, cresceram, se formaram e têm seus próprios empregos.

Mas, no início da carreira, com seus filhos mais jovens, a fim de chegar a essa posição, imagino ter sido desafiador.

Claro. Mas isso não significa que ainda não existam desafios (risos). No entanto, até chegar a esta posição que ocupo hoje, tive que equilibrar minhas responsabilidades como profissional e também gerenciar minhas responsabilidades como mãe. Não é uma tarefa nada fácil.

Aliás, é mais fácil falar do que, realmente, fazer. Tive de priorizar e abdicar de algumas coisas. Mas, é importante dizer, as coisas se tornam mais equilibradas em uma empresa que se preocupa com as pessoas e que também te ajuda a olhar para o seu lado pessoal, a flexibilizar o seu trabalho. Além disso, que foi fundamental, tive uma rede de apoio fantástica e tenho filhos abençoados.

Isso tudo serviu para garantir uma criação adequada?

Sim. Mas também acho que consegui avaliar a qualidade do tempo que queria dedicar aos meus filhos. Focar mais na qualidade do que na quantidade. Infelizmente, a quantidade não ocorreu pelas responsabilidades que já tinha no trabalho. Isso também acarreta em dar a eles expectativas claras, de que eles têm uma mãe trabalhadora.

Meus filhos aceitaram muito bem isso. Mas não vou mentir. Houve coisas que perdi, que queria ter feito com eles. Foram sacrifícios que tive de fazer para seguir com minha carreira e também para lhes garantir um futuro. Uma espécie de crescimento nos dois mundos.

Você tem de ter essa consciência. Como mencionei antes, esse equilíbrio. Hoje creio que meus filhos sentem muito orgulho de terem uma mãe que sempre trabalhou e que sempre entregou tempo de qualidade a eles. Os dois atualmente são engenheiros, estão bem e tenho certeza de que continuarão a fazer grandes coisas.

Tanto sentem orgulho que seguiram seus passos. Me perdoe pelo giro de 180 graus, mas gostaria de falar sobre a Cummins, mais especificamente sobre o foco da empresa no processo de descarbonização na América Latina. Quais iniciativas você lidera atualmente para cumprir tal missão?

Como estamos olhando para o futuro, temos de vislumbrar nosso crescimento potencial e qual seria o papel da descarbonização na América Latina. 

Nesse momento, temos o nosso produto diesel, nosso core, o que faz da Cummins uma empresa de sucesso há mais de 100 anos. E também temos nosso novo negócio, que é a Accelera, onde focamos nas tecnologias zero emissão. Estamos, dessa forma, trabalhando a jornada de descarbonização nessas duas searas da companhia.

Buscamos novas maneiras de tornar nossos produtos de base mais sustentáveis, com menos emissões, próximas a zero. Além disso, simultaneamente analisamos novas tecnologias para que possamos levá-las ao mercado quando for o momento ideal, quando fizerem sentido economicamente e forem acessíveis para nossos clientes.

E isso mostra a diversidade em termos de oferta que a Cummins oferecerá aos clientes no futuro, certo?

Temos um amplo espectro de aplicações, e atendemos clientes de diferentes áreas. Temos produtos que estão no setor automotivo, mas também atendemos agro e mineração. Justamente por isso, acreditamos que uma única tecnologia não servirá a todas as diferentes aplicações que temos.

Como os motores movidos a hidrogênio, por exemplo.

Nosso motor a hidrogênio é um projeto que estamos trabalhando para 2027. Estamos o testando já faz tempo, e a ideia é que ele chegue primeiro na América do Norte, na Europa, territórios onde tal pedido já é um requisito do governo.

Vamos nos empenhar, no entanto, para garantir que tenhamos os pilotos e também uma avaliação das necessidades em nossas região.

Vale dizer ainda que esses motores estão sendo trabalhados em três tamanhos distintos, de forma a atender necessidades dos nossos clientes. Por isso, será fundamental investirmos.

E, por falar em investimentos. Com sua formação em Engenharia, como você vê esses investimentos em pesquisa e desenvolvimento para os objetivos de Cummins, principalmente no tópico de transição energética?

São chave, claro. A inovação será o combustível do nosso futuro. Temos de ter times de tecnologia estruturados e focados em entregar soluções inovadoras para os consumidores. Nossos times de tecnologia certamente terão um papel fundamental a longo prazo.

E como a Cummins encara os desafios e oportunidades apresentados pela importância estratégica do Brasil na produção de energia renovável?

O Brasil tem potencial, claro, mas isso também exigirá infraestrutura, que precisa estar disponível para atender a essas novas tecnologias. E isso não vem apenas do setor privado.

Um outro ponto importante, necessário, é a busca de soluções de roda a roda, para que tenhamos toda uma cadeia descarbonizada.

Voltando ao hidrogênio, além da disponibilidade do hidrogênio verde, precisamos de determinadas garantias do setor público. O governo e os formuladores das políticas têm que se envolver no desenvolvimento de toda uma infraestrutura. Dessa forma, combinamos todos esses atores-chave que fazem parte da estratégia para podermos fazer a nossa visão acontecer.

Portanto, o setor público tem de atuar em conjunto com o setor privado para construir esta infraestrutura e fornecê-la aos clientes.

Certamente. Temos de ter todos os players envolvidos nessa grande mudança que estamos prestes a encarar. É uma jornada, claro, não é do dia para a noite, mas, eventualmente, temos que testar e desenvolver produtos ao mesmo tempo em que trabalhamos numa infraestrutura sólida no país.

E, mudando de assunto, na sua opinião, quais são os principais fatores que fidelizam o cliente nos mercados latino-americanos e como a Cummins aborda tais fatores em suas estratégias de negócios?

Nossa marca é reconhecida por seus produtos confiáveis. Historicamente, nossos motores e demais produtos mostram que estão em um patamar no qual o cliente pode nos levar a sério.

Também há um ponto importante a ser levado em consideração. Somos rápidos nas respostas quando acontece algo, quando questões são levantadas. Não dizemos que não temos problemas. Quando um problema ocorre somos rápidos e eficientes, ajudamos o cliente e garantimos que tudo seja resolvido da melhor forma.

Somos uma empresa de mais de cem anos. Muito do que aprendemos ao longo do tempo nos tornou mais fortes. No entanto, não somos uma empresa que não comete erros, mas sim uma companhia que aprende com esses de forma que não sejam repetidos no futuro.

E sobre o mercado brasileiro especificamente? O que teria a dizer sobre resultados e expectativas?

Eu diria que estamos comemorando os excelentes resultados do ano passado. A nossa participação de mercado continua crescendo e a presença da Cummins no Brasil será ainda mais significativa nos próximos anos. Tanto é que pretendemos dobrar as nossas operações no Brasil até 2030.

É o nosso deadline. Definimos nossas metas, nossos objetivos e estabelecemos bons planos que vão nos levar até lá. É um momento muito importante para nós.

E para 2024? Existem indicadores de crescimento?

2024 será um ano desafiador. No entanto, posso dizer que estamos esperando ter um bom ano no Brasil. 2023, embora nosso desempenho tenha sido excelente, vimos o mercado como um todo encolher no país. Mesmo assim, com escassez de demanda, fomos bem.

Temos um pouco mais de Brasil para discorrer sobre? Fique à vontade.

Gostaria de salientar alguns pontos. Estamos presentes no Brasil há 50 anos, e nossa operação está mais forte do que nunca. Estamos crescendo de maneira sustentável e rentável.

Consideramos que este ano, mesmo com os desafios, será de crescimento e esperamos uma forte performance. Além disso, continuamos a abastecer o mercado com nossos produtos Euro 6. Estes propulsores vêm tendo ótima aceitação dos nossos consumidores.

Também estamos exportando diretamente do Brasil. Atualmente, 15% dos nossos produtos saem do país para abastecer outros mercados locais, o que é motivo de muito orgulho para nossa empresa.

E podemos esperar maior número de exportações ou a empresa adotará estratégia distinta?

Pretendemos crescer em cada mercado, focar no crescimento de cada um deles. Obviamente, no ano passado tivemos uma grande oportunidade, pois as exportações foram chave para nossa operação.

No entanto, à medida que continuarmos a crescer certamente olharemos atentamente para essas oportunidades. Isso, claro, dependendo de como os mercados se comportarem.

É claro que, se tivermos operação e mercado [no Brasil] sólidos, posso dizer que a tendência é de crescimento. Dessa forma, aumentaremos o potencial da nossa operação e fortaleceremos as demais áreas.

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