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Volkswagen: O mercado não está reagindo e a recessão econômica deverá perdurar por mais tempo

Presidente da empresa, Pablo Di Si prevê crise mais prolongada


PEDRO KUTNEY, AB

Quase quatro meses de crise intensa provocada pela pandemia de coronavírus no Brasil foram suficientes para abalar bastante o otimismo de Pablo Di Si, presidente da Volkswagen América Latina, em uma possível retomada rápida e sustentável dos negócios na região sob sua gestão. Segundo ele, os primeiros sinais de julho mostram que o mercado não está reagindo e que a recessão econômica deverá perdurar por mais tempo, o que coloca em risco a manutenção de empregos no setor.

“O mercado não está reagindo e temos o risco como indústria de precisar readequar a produção a uma realidade muito difícil. Não será uma crise de alguns meses, vamos sofrer por mais tempo e não será fácil, talvez não tenhamos a recuperação que precisamos nem em 2021 ou 2022”, disse Pablo Di Si.

O executivo afirma que pretende estender o máximo possível o uso de instrumentos disponíveis para manter empregos. Em abril a Volkswagen adotou os regimes previstos na Medida Provisória 936 de suspensão temporária de contratos ou redução de jornada e salários por até dois meses, com estabilidade de mais dois. Dessa forma, os acordos fechados nesse primeiro momento chegam ao fim em julho. Agora, com a renovação da MP, a intensão é ampliar até o fim do ano a aplicação dessas flexibilizações para evitar demissões.

“Vamos conversar nos próximos dias com os sindicatos e acredito que não deveremos encontrar qualquer resistência por parte deles para estender os regimes da MP. O que preocupa não é esse curto prazo, mas se o mercado não se recuperar a médio e longo prazos teremos de iniciar outro tipo de negociação com os empregados”, afirma Di Si, em alusão a um possível plano para reduzir o quadro de funcionários no esperado cenário de demanda reduzida e aumento da ociosidade da fábricas.

CRISE LONGA

Di Si projeta que o crescimento já avistado do desemprego, aliado à maior aversão dos bancos para aprovar financiamentos, provocará uma inevitável e expressiva redução da demanda por veículos no País. Entre as diversas projeções já feitas, ele avalia que a queda do mercado brasileiro este ano está mais próxima dos 40% estimados pela associação dos fabricantes, a Anfavea, do que os 30% projetados por alguns consultores. Seja como for, nenhum dos dois porcentuais vai garantir o mesmo nível de emprego nas montadoras, que já iniciaram um novo ciclo de demissões.

“Gostaria de ser mais otimista, mas pelo que já vimos nos primeiros dias de julho (queda de 50% das vendas na comparação com mesmo período de 2019), não será por aí. Para manter os mesmos quadros de hoje a retração não poderia ser maior do que 20%, mas não é isso que estamos vendo, a dificuldade é bem maior”, destaca Di Si.

O ritmo da recuperação no melhor cenário projetado pela Anfavea, de crescimento médio de 11% ao ano a partir de 2021, faria o mercado brasileiro de veículos voltar aos mesmos níveis de produção e vendas de 2019 somente em 2025. Di Si concorda com a projeção, mas pondera que o desenho do cenário futuro depende muito de um pacote de estímulos à economia que poderá ser implementado. “Entendemos que cada governo têm suas dificuldades para isso”, pontua.

FORNECEDORES EM RISCO

“Tentamos apoiar neste momentos os fornecedores e nossos parceiros de negócios, temos reuniões diárias, dividimos nossos protocolos de volta ao trabalho com segurança, trocamos informações e fazemos gestões junto ao governo, mas não podemos ajudar financeiramente todos porque também temos problemas”, conta Di Si. Segundo ele, já aconteceram algumas baixas na cadeia de fornecimento, algumas empresas menores fecharam, outras terão de ser absorvidas por companhias maiores e em alguns casos será necessário importar peças que deixarão de ser produzidas no País.

Sobre as negociações que estavam sendo feitas com o governo e BNDES para a abertura de linhas de crédito especiais, com juros menores, com o objetivo de ajudar a cadeia de fornecimento a atravessar o período crítico da pandemia e de quarentena sem faturamento, Di Si afirma que não houve progressos.

INVESTIMENTOS ADIADOS

No quadro que se desenha, o presidente da Volkswagen reconhece que muitos investimentos terão de ser necessariamente adiados. Pelos cálculos do executivo, o setor já queimou algo como R$ 40 bilhões em apenas três meses, valor equivalente ao que seria aplicado em diversos programas de desenvolvimento nos próximos cinco anos. “Claro que isso tem impacto direto nos nossos investimentos, não teremos mais os mesmos recursos e estamos trabalhando para readequar o tamanho da indústria à uma nova realidade que vai durar um longo tempo”, ressalta.

Assim como já adiantou a Anfavea, Di Si também defende o adiamento do cumprimento de objetivos de aumento de eficiência energética e adoção de equipamentos de segurança previstos para os próximos anos no programa Rota 2030.

“Todas as metas previstas devem ser mantidas, mas se não forem adiadas vamos reduzir a produção aqui, será muito mais fácil importar modelos híbridos e elétricos e assim eu posso cumprir muito fácil todas as metas. É isso que o governo tem de entender. Precisamos fazer um balanço disso, pois em três meses gastamos o que tínhamos reservado para investir nos próximos cinco anos nesses programas”, afirma.

O atual programa de investimentos da Volkswagen no Brasil, de R$ 7 bilhões no período 2017-2020, deverá estender para o próximo ano os três últimos dos 20 lançamentos da marca previstos neste ciclo. “O Nivus (lançado este mês) foi o 17º, os outros faremos em 2021”, confirmou Di Si.

OPERAÇÕES EM LENTA ASCENÇÃO

Após cerca de dois meses de paralisação, todas as fábricas da Volkswagen no Brasil retomaram a produção desde o fim de maio. Na Via Anchieta, em São Bernardo do Campo (SP), a planta voltou a trabalhar em um turno, logo começou a produzir o Nivus e quase um mês depois, em 22 de junho, reiniciou o segundo turno graças à rápida ascensão do modelo. Em Taubaté (SP) a operação segue em um turno, enquanto em São José dos Pinhais (PR) e na unidade de motores em São Carlos (SP) foram adotados dois turnos parciais.

Di Si credita à boa aceitação dos lançamentos feitos ao longo dos últimos três anos o desempenho da Volkswagen, que embora tenha registrado queda drástica de 34% nas vendas do primeiro semestre no Brasil, foi melhor do que a retração média de 39%. Foi a marca que mais ganhou participação no País nos seis últimos meses e em junho chegou à liderança do mercado. “É importante mas é momentâneo, principalmente por causa de vendas do T-Cross para PCD (quase 3 mil unidades) que fizemos desde março mas os carros só foram emplacados em junho”, explica.

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